domingo, abril 22, 2007

Majestades e magistrados

Àqueles que habitualmente por aqui passam, as minhas desculpas por uma ausência que não quis. Está ultrapassado o motivo impeditivo de, por este meio, voltar ao vosso convívio.
Pretendia abordar vários temas, tal a panóplia de asneiras que têm grassado pela nossa repúblicazinha de trazer por casa. No entanto vou-me cingir a um, de forma sentida e sucinta.

Tema I - O juiz desembargador “distraído”.

Começou finalmente a mexer comigo o caso do sargento Matos Gomes acusado de sequestro e aguardando julgamento em prisão preventiva sem, contudo, estarem preenchidos os pressupostos, no entender de vários e ilustres juristas, para que aquela tipologia penal (sequestro) houvesse ocorrido.
A fuga para a frente do colectivo que aplicou a medida de coação é de tal forma evidente que quase apetece dizer que o Centro de Estudos Judiciários (CEJ), forma majestades em vez de magistrados.
De facto, vem acusado de crime de sequestro (Artº 158º, nº1, Código Penal), “Quem detiver, prender, mantiver presa ou detida outra pessoa ou de qualquer forma a privar da liberdade…”, sendo a moldura penal agravada se o agente praticar o crime “ contra pessoa particularmente indefesa, em razão da idade…” (Nº2, al. e), da mesma norma).
Isto é, o tribunal entendeu que o sargento exerceu todos ou algum daqueles poderes malévolos sobre a criança, a que chama filha, e jamais dará o braço a torcer, reconhecendo ter exagerado na decisão.
Eu sei, pela parca experiência, mas própria, o que moveu os magistrados. O que de facto lhes formou deficientemente a convicção foi o não verem o arguido quebrar na sua frente ao lhe ser aplicada a medida de coacção, olhá-los sempre olhos nos olhos, como é próprio dos homens de honra que nada temem por nada de errado terem feito.
O mal grande da grande maioria da magistratura é a incapacidade de reconhecer que erram e que, por vezes, a experiência de que se arrogam, mais não é do que a prática reiterada dos mesmos erros.
Sempre respeitei as decisões dos tribunais e quando não concordar com elas ataco-as da única forma possível, isto é, pelo recurso. No entanto, o Juiz Desembargador Eurico Reis disse esta coisa estrondosa, ao arrepio do Estatuto dos Magistrados Judiciais e, maxime, da Constituição da República:

Artigo 4º(Independência)
1. Os magistrados judiciais julgam apenas segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento pelos tribunais inferiores das decisões proferidas, em via de recurso, pelos tribunais superiores.

Esquecendo-se disto a que se chama lei e a que está vinculado:

ESTATUTO DOS MILITARES DAS FORÇAS ARMADAS

Artigo 15.º
Outros deveres
(…)
2 - O militar deve ainda:
h) Usar uniforme, excepto nos casos em que a lei o prive do seu uso ou seja expressamente determinado ou autorizado o contrário;

Artigo 17.º
Violação dos deveres
A violação dos deveres enunciados nos Artigos anteriores é, consoante os casos, punível nos termos previstos no Regulamento de Disciplina Militar (RDM) ou no Código de Justiça Militar (CJM).
Se ainda isto não bastasse…

REGULAMENTO DE CONTINÊNCIAS E HONRAS MILITARES
Artigo 19.º
Honras militares
O militar tem, nos termos da lei, direito ao uso de uniforme, títulos, honras, precedências, imunidades e isenções inerentes à sua condição militar.

Fiquei assim a saber que o dito Juiz não conhece a lei porque não lhe apeteceu, não procurou conhecê-la e que arrogantemente se preparava para a violar, imbuído de um corporativismo doentio que lhe toldou, como faz a muitos, o discernimento.
Elevou-se, assim, à categoria de ave canora de varanda, fauna que, aliás, grassa cada vez mais por cá.
Contactei a RTP por e-mail para que desse conhecimento ao magistrado do normativo jurídico que rege os militares, assim como deste texto, não tendo obtido resposta até hoje.

É este o país que temos, em que deveria ser prestigiante para qualquer aluno estudar onde o primeiro ministro estudou, em que deveriam os titulares de cargos públicos serem isentos de mácula e mentira, em que o ministro do ensino superior não dissesse que um prestigiante percurso académico é aquele que se faz em mais anos que os necessários para a licenciatura, em que um aluno não tratasse por meu caro um mestre, enviando-lhe papel timbrado da secretaria de estado onde exercia funções, usando meios do estado (papel, fax, carta e selos) em interesse próprio e não da função. Ou seria?
Este mesmo país, onde alguns juízes esqueceram que administram a justiça em nome do povo é o mesmo país que se prepara para admitir ao CEJ o Professor Doutor Hugo Marçal, conforme vem publicado no DR 40 II Série, de 26 de Fevereiro, onde consta na página 4961, com o nº 802. Que vergonha...
Usar a presunção de inocência até ao trânsito em julgado de uma sentença, da forma que se usa neste país, é pois a cereja no bolo de um país que preza mais o chico espertismo, o latrocina de colarinho branco, o político corrupto, os autarcas corruptos, elevando a honestidade à categoria de pecado mortal.
O meu avô dizia para acreditar nas pessoas que coram, pois essas sabem o significado da palavra vergonha. Deixo-vos, assim, com este pensamento...

"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver crescer as injustiças, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos homens, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto."
( Rui Barbosa )

20 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Vergonha que se perde no tempo...bjca e meu rasto________Cõllibry

22 abril, 2007 23:48  
Blogger A. João Soares said...

Parabéns.
Visite o DO Miradouro e receba o seu prémio

Thinking Blogger Award

Recebi do blog O Anarquista o prémio Thinking Blogger Award, um selo que promove a divulgação de memes (genes culturais de Richard Dawkins) e que implica a eleição de cinco blogues considerando que estes nos fazem pensar. Desde já agradeço ao amigo Savonarola a distinção de me incluir nesta lista muito honrosa. É meu dever indicar e promover blogs que duma forma ou de outra me fazem reflectir.

- Alcobaça. Gentes e Frentes – Um alfobre de ideias que transcendem o interese regional e estimulam a reflexão sobre temas pouco vulgares.

- Aqui d'Algodres – Pela defesa interessada da sua região, sem esquecer o País total.

- Fio do Prumo - Esclarecimentos de assuntos que passam um pouco ao lado das preocupações gerais e sem cair no excesso de corporativismo.

- Montado Altaneiro – Um estilo de escrita que nos estimula a aperfeiçoar o Português literário, com forte vertente patriótica.

- Uivomania – Um brito de alerta para acordar os distraídos e olharem os problemas regionais que não devem ser menosprezados.

O «Do Miradouro» agradece esta distinção ao caro amigo Anarquista, Savonarola, e, àqueles que com as suas visitas e os comentários que deixaram foram os principais obreiros desta posição alcançada pelo estímulo e inspiração para os trabalhos aqui expostos. Um blogue é obra de todos vós e só não vos envio um pedaço deste selo, porque não sei como fazê-lo.

Muito obrigado e espero que continuem a ajudar-me para vos dar mais prazer com o que aqui vier a ser publicado.

Parabéns e um abraço
A. João Soares

23 abril, 2007 16:56  
Blogger Ana Luar said...

Olá Manel... embora nem sempre comente visito-te assiduamente. E como prova do meu carinho deixei um miminho para ti no meu blog.

23 abril, 2007 17:29  
Blogger as velas ardem ate ao fim said...

Sabes acho que hoje em dia quem é honesto tem medo de o ser.

Nada pior que vivermos com medo, com uma justiça injusta e com uns a rirem se dos outrso só porque se acham espertos.

não pertenço a este mundo.Sinto-o.

jos e obrigada por seres quem és

23 abril, 2007 19:07  
Anonymous Anónimo said...

Oi Bambino!
Porque te conheço, porque sei quem és, porque sei como és e de tudo o que és capaz, não me surpreendeu o texto. Ou melhor, surpreendeu pela coragem, pela lucidez, pelo enquadramento e pela qualidade literária que alguns licenciadozecos em direito a quem permitem frequentar o CEJ, se arrogam no direito do direito fazer linha recta.
Hoje, é um daqueles dias em que, apesar de tudo me sinto feliz.
Disseste de modo irrepreensível aquilo que eu diria de modo muito mais grosseiro.
Não admira, sou SARGENTO. Porém, tenho muito mais massa cinzenta na minha marmita do que esse juizeco de meia tigela, o protótipo da antítese da Girafa, porque tem uma enorme garganta para um pescoço atarrachado entre os ombros que mais parece um garrafão sem gargalo.
Acho que o problema deste mentecaptus, reside no facto da NOSSA FARDA lhe causar vertígens e quem sabe se não será um frustrado que um dia terá decidido seguir a carreira das armas mas, a quem não foi reconhecido perfil, nem inteligência, nem bravura, nem honra, nem tão pouco dignidade para a vestir.
Sendo assim, limitou-se a vestir, se é que veste, uma manta preta por cima das espáduas, sim espáduas, sem ofensa para aqueles lindos, bravos e inteligentes seres que tu e eu tivemos a honra de montar.
A resposta está dada.
Quanto à comunicação social, não te iludas. Está definitiva e decididamente ao serviço da política, dos políticos e deste tipo de energúmenos que se dizem magistrados ou não fosse a promicuidade entre estes sectors mais que vergonhosa.
Da minha parte, muito obrigado pela defesa da Honra, da Postura e da Correcção, com que Militares muito dignos ainda se insurgem contra esta cambada de anormais.
Um abraço.

23 abril, 2007 21:14  
Blogger O Transmontano said...

Bambino,
Se agora consegui configurar a minha conta de Blogger, queria fazer saber que o comentário que publiquei como anónimo, fi-lo porque na ocasião não consegui fazer login.
Um abraço e obrigado.

23 abril, 2007 22:31  
Blogger Barão da Tróia II said...

A Classe Juízes, precisava de humildade e sensatez, coisas que não possuem e dúvido que saibam ser, boa semana

24 abril, 2007 08:43  
Blogger Isabel Filipe said...

Absolutamente de acordo com todo o teu texto ...
e tb não tenhjo qualquer duvida em relação a isto:

"O que de facto lhes formou deficientemente a convicção foi o não verem o arguido quebrar na sua frente ao lhe ser aplicada a medida de coacção, olhá-los sempre olhos nos olhos, como é próprio dos homens de honra que nada temem por nada de errado terem feito.
"


beijinhos

24 abril, 2007 13:48  
Blogger sonhadora said...

Fazes parte dos meus sonhos.
Beijinhos embrulhados em abraços

25 abril, 2007 01:43  
Blogger Um Poema said...

A vergonha das enormidades majestáticas produzidas por mentes pequeninas aninhadas atrás de togas, os repetidos atropelos à justiça que, por acção dos seus manipuladores, cada vez mais se aparta dos valores e do sentir do povo do qual devia emanar e quem deveria servir, faz-nos crer que o tempo se esgotou, ou está prestes a esgotar-se.
A imoralidade descarada, a falta de escrúpulos ostensiva, o oportunismo degradante que se instalou e se tornou credo único dos políticos, faz-nos acreditar que não é possível Portugal cair mais baixo.
A arrogância judicial que, desde o início caracteriza o tratamento dispensado a quem amou, ama e tenta proteger, a todo o custo, uma criança que não pediu para ser gerada e que teve a sorte de não ser morta à nascença ou abandonada num qualquer contentor de lixo, é evidente.
...........
Cada povo tem o que merece, diz o saber popular.
...........
Num país (des)governado por gente sem escrúpulos, onde a mediocridade impera, porque é que a (in)justiça não há-de reger-se por majestática e desprezível arrogância?

Obrigado por este grito indignado com o qual me identifico sem reservas.

Um abraço

25 abril, 2007 03:11  
Blogger as velas ardem ate ao fim said...

Feliz dia da liberdade!

bjinhos

25 abril, 2007 15:52  
Blogger leituras said...

Precisas e verdadeiras as palavras de Rui Barbosa.
Sobre o que contas, um único comentário:
É absolutamente degradante o estado da justiça!

Boa semana

26 abril, 2007 00:38  
Blogger Barão da Tróia II said...

Concordo inteiramente com a tua opinião, bem sei que a maioria da malta, isto incluindo alguns sectores militares se ficaram nas covas acagaçados à espera do que a coisa ia dar, mas por liberdade literária, acho que o cravo é do povo e povo aqui são todos, sem essa trampa dos rótulos de classe que só nos tem feito mal, o cravo é um simbolo de esperança, é esse o sentido que quero dar à coisa, sem conotações políticas imbecis, sem necessidade de atitudes estúpidas de negação de uma direita merdosa como a que temos ou de apropriação como a esquerda de igual modo merdosa.
Para mim que tinha só 6 anos em 74, o cravo simboliza uma esperança, um ideal que ainda não está cumprido, ok sou um imbecil, pois se calhar sou. Um abraço

26 abril, 2007 11:03  
Blogger Menina Marota said...

"...O mal grande da grande maioria da magistratura é a incapacidade de reconhecer que erram e que, por vezes, a experiência de que se arrogam, mais não é do que a prática reiterada dos mesmos erros.(...)"

Diria antes que o mal está na pequenina lucidez e capacidade dos pequenos homens, de distinguir pelos seus próprios meios, aquilo que Salomão tão bem distinguia com o coração.

Este é um dos caso que me faz sentir que o 25 de Abril não existiu no coração de muita gente, porque continuam a arrogar-se de prepotências, incapazes de discernimentos e juízos e vejo que cada vez mais o sonho de Homens livres, que levou a uma conquista de libertação de ideias e valores, não passou no coração de muita gente. É verdade, que hoje em dia, se escreve abertamente o que se pensa, sem sermos penalizados abertamente por isso. Mas, no fundo, não passa de um sonho. Quantos de nós não conhecem pessoas que foram colocados na “prateleira” ou dispensados de serviço, não obstante serem bons profissionais, por não serem da “cor” de quem está no governo ou se manifestarem abertamente contra qualquer facto? As represálias continuam a fazer-se sentir. Não se é preso é verdade, não se lhe retira a liberdade física, mas quantas vezes se não lhes retiram a liberdade da alma?
Por isso, recordo com uma certa nostalgia, o 25 de Abril. Porque ele também levou à corrupção, a uma desenfreada luta pelo poder, onde não se olha a meios para se atingir os fins. E é ver, cada vez mais, as “novelas políticas” que todos os dias passam nos écrans das televisões.
Homens como tu, que abertamente falam dando a cara, sem medos, com o coração e a voz da razão, em todos os aspectos da vida, sem se importarem com o que lhes possa acontecer têem que ser louvados e respeitados. Tal como tu admiro e respeito acima de tudo a coragem do sargento Matos Gomes, que de cabeça levantada e olhar corajoso, enfrenta o “mundo” por aquilo que acredita e ama, mesmo perdendo o direito à sua liberdade!
Abraço-te carinhosa e respeitosamente, por tudo aquilo que significas como Homem Livre.

27 abril, 2007 08:32  
Blogger Isabel Filipe said...

bom fim de semana para ti

beijinhos

27 abril, 2007 11:06  
Anonymous Anónimo said...

Caro Manel, ando a dizer isso á muito...

Mas o teu texto está soberbo!

Com um abraço te deixo aqui:

OBRIGADO A TODOS



O Aromas de Portugal ultrapassou os 10000 visitantes. O contador só foi colocado quase dois meses depois do seu início.
É para mim um orgulho que todos vós me transmitis quando me visitam.
Quero dizer-vos, que continuarei sempre, com a verdade habitual, a "gritar" pelos valores da solidariedade, da camaradagem e da amizade. Continuarei aqui a fazer eco dos valores de Portugal, aqueles em que humildemente me revejo, livremente é claro.
Não esquecerei nunca os deficientes, os que não podem sequer dizer nada, em sua defesa, pelos seus direitos.
Aos camaradas que habitualmente me lêem no Passa Palavra digo que, aqui o Aromas de Portugal é o meu local. Envio um abraço ao camarada Magno, ao Lobo do Amaral, ao António Borralho, a todos os outros também.
Não sou por "tricas" associativas... Ouço as "duas" partes e, o que ouço, não é claro, para o meu gosto e exigência.
Ser Comando, na minha interpretação, tem um grau de exigência, que por vezes só se conhece em Missão, em combate, na perda e na dor.
Estou convosco, aqui!
Com Aromas de Portugal, com verdade e independência,
Por Portugal e pelos Comandos!

MR

27 abril, 2007 16:45  
Blogger Micas said...

Sinto sempre uma enorme tristeza quando leio noticias como este caso concreto no meu país. É incrivel ao ponto que Portugal está a chegar. A Justiça Portuguesa então, nem é bom falar...
Excelente texto Manel e muito conveniente mesmo
Beijinho e bom feriado

30 abril, 2007 20:46  
Blogger Cleopatra said...

Este comentário foi removido pelo autor.

24 junho, 2007 23:24  
Blogger Cleopatra said...

Este comentário foi removido pelo autor.

24 junho, 2007 23:26  
Blogger Cleopatra said...

O Dr Eurico Reis, não fez a tropa e não sabe o que é um militar.
LAMENTÁVEL:
Lamentável meu caro colega!!!

Olhe, digo-lhe como disse ao Ex Ministro das Finanças -Eduardo Catroga:- Antes de falar, informe-se!

24 junho, 2007 23:28  

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