sexta-feira, setembro 30, 2005

Res Publica - A escravatura com salário.

III - A Revolução Indusrial

Há uns tempos largos estava eu farto da retórica sobre a herança clássica da democracia, de quão agradecidos tínhamos de estar ao pensamento grego e à evolução (questionável) da sociedade e perguntava-me:
- Atão Maneli, se isto tem sido uma evolução porque é que estamos cada vez mais na mesma?
E foi assim que decidi ir ver por mim aos livros e construir a minha interpretação das coisas. Está a explicação dada. Para tal já havia adquirido e ainda não lido, uns livrinhos em inglês/grego, sim porque isto de se dar a entender que se fala estrangêro, fica bem e dá prestigio, quanto mais não seja do oleoso como o barco que se afundou ao largo da Galiza. Oleoso, Prestige, tão a ver? – Disse uma piada porra!
Bem, como referi, comprei uns livrinhos com uns bonecos dentro, os quais são reproduções de pinturas gregas em objectos de cerâmica e como motivos decorativos nas paredes de construções. A loja é na Plaka, um dos bairros mais velhos de Atenas, a par com o de Monastiraki, logo na primeira rua quando se desce da Acrópole, contornando-a pela face norte ao longo da Theorias. O dono, o Sr. Niko (Nikopolidis) é um verdadeiro poço de cultura não censurada pela herança judaico-cristã, para além de amigo de um outro grego meu amigo, ao qual presto aqui a minha homenagem, o bom Evangelos Nannos, Vangelis para os amigos. Foi ele que me aconselhou os livros, os quais versam sobre um tipo de arte que não caiu nas garras dos arqueólogos europeus e americanos que pilharam a Grécia, assim como outras civilizações antigas. Um dia, lá mais para a frente, os bonecos e outros conteúdos dos livros serão objecto de tratamento. Aprende-se muito a beber vinho grego ou “ouzo”, ao som de umas “Busukadas” e a comer “sipura” grelhada (dourada).
Saltando uns séculos e com o advento da máquina ferramenta, vieram os verdadeiros “democratas” da revolução industrial, reconhecendo “finalmente” o direito ao trabalho às mulheres e até às crianças, no seguimento do iluminismo que por azar, só por azar, para uns tinha as lâmpadas fundidas.
A força bruta dos homens foi substituída pelas mãos pequenas e dedos ágeis das mulheres e crianças, melhor adaptadas às novas condições tecnológicas e mais capazes para manusear os teares mecânicos. A isto aliou-se a possibilidade de maior lucro pelos patrões, uma vez que era entendimento comum que a retribuição salarial a pagar a mulheres e crianças teria de ser menor, por não haver força bruta implicada.
E eu a pensar que a Revolução Industrial havia sido um bem para a humanidade em geral como consta dos livros do ensino que temos. No entanto, a verdade é bem mais terrível, em pouco tempo todas as barreiras do inadmissível foram ultrapassadas e nas regiões mais industrializadas do Reino Unido a degenerescência da raça foi assustadora e a esperança média de vida desceu a 35 e a 15 anos de idade.
Assim se explica, de forma resumida, os grandes êxodos de emigrantes para o novo mundo, i.e., a segunda leva em massa, porque a primeira assentou na oferta de um bilhete, só de ida, às prostitutas de todas as grandes cidades do reino, assim como da oferta do estatuto de colono à grande maioria dos detidos nas prisões da Grã-Bretanha. Promoção oferecida pelo Rei Jorge I e retribuída duas gerações mais tarde ao seu neto Jorge III pelos netos dos colonos com a independência das 13 Colónias. Que ingratos. Afloro aqui, a voil d’oiseau , a fuga à fome dos irlandeses, situação também oferecida pela casa real britânica devido aos moços gostarem de ser católicos e terem tido uma pequena empatia pelo Napoleão. Não, não é o conhaque, é o Bonaparte mesmo.
Retomando. A revolução industrial transformou as massas pobres camponesas em massas pobres operárias das cidades industrializadas da velha Albion. Era autêntica mão-de-obra escrava, antes os homens, agora mulheres e crianças, famílias inteiras, tomavam uma frugal refeição junto às máquinas e quando o empregador dava por finda a jornada de trabalho, recolhiam aos catres de um barracão imundo montado a propósito nas imediações. Aí, por patrões e capatazes, sofriam muitas vezes abusos sexuais e quando do acto resultasse gravidez, ou eram despedidas ou pariam junto às máquinas, morrendo muitas vezes de febre puerperal.
Por outro lado, o trabalho infantil era entendido como uma necessidade vital do capitalismo, actualmente denominado de liberalismo económico, uma vez que era necessária a perícia das mãos pequenas e finas para o manuseio das novas tecnologias, como agora o é para manufacturar calçado desportivo e bolas de marcas de renome mundial. Das vozes que se ergueram contra tal estado das coisas, algumas o capitalismo soube como calá-las, “untando” com dinheiro as mãos do clero discordante, comprando os pequenos burgueses com postos de trabalho para altos dirigentes ou comprando os jornais contestatários. Da mesma forma que se compram agora os dirigentes associativos universitários para que não façam ondas, ou os potentados da informação compram os jornais discordantes. Há exemplos desses na política portuguesa e que hoje ocupam altos cargos em Portugal e na Europa Unida…às vezes!
Chegamos à nossa democracia. Actualmente as mulheres ainda não recebem salário igual ao dos homens em quase todas as actividades em que emparelham com eles. Em algumas fábricas do nosso país crianças manuseiam explosivos, máquinas de fazer calçado ou outras e recebem um terço do que um homem recebe. Nem lá deveriam estar. Que se lixe, não são meus filhos.
Aos sucessivos governos da nossa “democracia” interessa manter este estado de coisas. O povo numa quase iletracia, crendo que a democracia que temos é a melhor forma de governo. É-o de facto melhor do que qualquer ditadura, mas não é a melhor democracia, aliás, não é democracia, é partidocracia, interesse económicocracia, lobbycracia, tudo menos vontade popular verdadeira.
Vejamos o ensino. Não é o número de anos de frequência escolar que define a assimilação de cultura por um povo, é a qualidade da cultura que se transmite que formará melhores sociedades. Elevar em número de anos o ensino obrigatório não é garantia de melhor educação, nem se poderá nunca partir dessa premissa. Só serve para estatística. Como poderá alguma vez o ensino público ter a atenção séria e honesta da classe política se têm os seus filhos a estudar até ao 12º ano em instituições privadas, para garantir uma boa média de acesso, quer pela competência de algumas dessas instituições, quer pelo “comprar” da média, indo depois para o ensino público universitário porque é mais barato e lá leccionam os amigos do papá. É que convenhamos, ter um “canudo” da pública é mais “in”, não significando ser-se melhor licenciado. Depois há as empresas do “estado” para garantir os empregos aos filhos dos old chaps. Exemplos? Vão à PT, à EDP e a outras e vejam quantos filhos de figuras públicas lá estão empregados. É o eterno ciclo do “uma mão lava a outra e as duas lavam a cara”.
A juventude não protegida de hoje apercebe-se disso bastante cedo e então, tomando consciência da qualidade de sociedade e de futuro que lhes estamos a proporcionar, facilmente segue outros caminhos. Vivem uma pseudo igualdade com os outros jovens da sua idade de classes mais favorecidas. Então se são mais favorecidas, quem lhes fez os favores e não os fez aos outros, aos que mais precisam?
Qual mais favorecidas, qual nada, há é classes mais protegidas e outras sem protecção nenhuma. Assuma-se de uma vez por todas a verdade da MENTIRA que é a “democracia” portuguesa.
Políticos do meu país, quando em campanha eleitoral pelas ruas da minha pátria se depararem com alguns cidadãos que se afastam ostensivamente de vocês, posso ser eu e outros tantos como eu que nada querem convosco, não são dignos de nós. Pelo meu lado é também por medo de vos pisar. Não porque vos possa magoar, mas porque já tenho as botas caneleiras rotas nas solas e ao pisar-vos, para além de sujá-las, vou também encharcar as meias com a matéria viscosa e fétida de que vocês são feitos.

3 Comments:

Blogger Zica Cabral said...

Boa Maneli. Quem fala axim (que eu xou da Beira Ialta) não é gago nem mudo nem tem problemas liguistico (ou de lingua?).
Gostei, gostei francamente. Da liçãozinha de História sobre a "bendita" revolução industrial. As dadivas de suas Magestades inglesas, sobretudo no que respeita os irlandeses, abrindo-lhes as portas , generosamente a uma vida melhor.....mas noutro país que aqui não os queriam......

Até que enfim que eu vejo escrito - e bem escrito - tudo o que me vai na alma em relação ao que se passa em POrtugal. Eu sei, só afloraste um pouquinho mas se bateres noutros campos as conclus~oes são as mesmas.
Quanto à mão d'obra infantil cito:
"uma vez que era necessária a perícia das mãos pequenas e finas para o manuseio das novas tecnologias, como agora o é para manufacturar calçado desportivo e bolas de marcas de renome mundial".

e acrescento, componentes electronicos minusculos que as crianças da Tailandia China Indonesia e afins, manipulam durante mais de 14 h por dia, muitas vezes seguidas e que lhes dão cabo dos olhos. Crinanças com uma esperança media de vida de 14 ou 15 anos e que ficam cegas normalmente por volta dos 12 anos sendo depois atirados, pelos proprios patrões , para a protituição onde acabam por morrer vitimas de violencia fisica ou de doenças sexualmente transmissiveis.
Sim , a revolução industrial ainda não acabou com as regalias das meninas e meninos desses países. Sobretudo das meninas.
Citando-te outra vez:
"Políticos do meu país, quando em campanha eleitoral pelas ruas da minha pátria se depararem com alguns cidadãos que se afastam ostensivamente de vocês, posso ser eu e outros tantos como eu que nada querem convosco, não são dignos de nós. Pelo meu lado é também por medo de vos pisar. Não porque vos possa magoar, mas porque já tenho as botas caneleiras rotas nas solas e ao pisar-vos, para além de sujá-las, vou também encharcar as meias com a matéria viscosa e fétida de que vocês são feitos":
Faço minhas as tuas palavras
obrigado por este post!!!!!!
um beijão
Zica

03 outubro, 2005 21:43  
Blogger Desconhecida said...

Obrigada pela visita! Volta sempre.

04 outubro, 2005 22:47  
Blogger Menina Marota said...

Depois de ler o teu texto, em que o sorriso se foi alargando, cada vez mais, li o comentário da Zica!

Bem... estamos então conversados e de acordo!!!

Assino por baixo do texto e do comentário.

Ah... poder-te-ia dar uns nomes de uns familiares de individualidades que estão à conta das "cunhas" e das costas dos seus "dignos" entes... eheh

Mas isso fica para melhor altura... eheh

Um abraço ;)

06 outubro, 2005 12:35  

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